A idade não tem me trazido sabedoria,
leveza de espírito ou algo assim, a maturidade tão aclamada, aquela que
ingenuamente ansiava como forma de equacionar os fantasmas que arrasto pela
vida a fora é uma imensa falácia – como só a vida sabe ser. Tenho deixado a luz
acesa, não por causa dos fantasmas, é a mim que temo, eu, minha inimiga mais
feroz, eu a detentora da caixa de pandora – entupida de auto sabotagens.
Ando desbocada, mas isso também se
coloca na conta da idade, acumulei impropérios lançados contra mim a vida
inteira, agora ando eivada de palavrões, as tais palavras inadequadas – sem
vulgaridades, palavrões podem sim soar libertadores, mesmo que durem um átimo
de segundo, não se constituindo portanto em alívio.
Pensei, e isso eu faço como só as vacas
conseguem fazê-lo, remoendo até não restar mais nada. Mas dizia, pensei em sair
por aí batendo portas, como cobrador investido do direito de apontar o dedo na
cara do bocado de gente que dispôs do melhor que pude dar no tempo que ainda
tinha como ofertar – sujeitos que acolhi com ouvidos, ombros e ar, fora as
coisas práticas para sobreviver, se fosse só um dia para ficar um cervejinha
para relaxar, se fosse alguns meses a casa e a vida, se fosse de vez em quando
uma paciência que não tenho nem pra mim. Resolvi deixar para lá, gratidão deve
ser coisa sentida, não cobrada, das minhas decepções só restam a capacidade de
não esperar gratidão de quem tem memória curta!
Ando tropeçando na minha sombra, não
tenho mais tapetes para jogar em cima dos dejetos de um ser em frangalhos que a
cada investida da vida resta mais só, e muito mais triste, esse negócio de
fazer terapia libera a língua e os dedos, e nem pornográfico é...talvez - se
ela me dissesse que não faz mal, que tenho escolhas que independem dos outros,
que o mundo não é sujo e triste, que pessoas boas até existem – talvez assim eu
me convença, e peça gentilmente as portas desse porão em que me meti, daqui só
consigo ver o mundo pelos olhos tristes desse eu sem mim...
Anne Damásio