quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Um ano e três meses...


Demorei para ir ao encontro do lugar que teoricamente lhe abrigava, talvez por não saber lidar com a idéia de perda...talvez por não saber lidar com sua perda, e com isso lembrei de um fragmento de Cora Coralina, que afirmava: Sim, tenho a certeza de que a vida nos dá os netos para nos compensar de todas as mutilações trazidas pela velhice. São amores novos, profundos e felizes, que vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, deixado pelos arroubos juvenis.
Mas essa afirmação amainava a minha dor, não te trazia de volta, e era estranho depositar um buquê sobre uma lápide, e imaginar a fragilidade putrefata dos humanos. Era estranho passar a mão involuntariamente naquele mármore frio, e saber-lhe materialmente ainda lá e espiritualmente tão distante. Foi sofrido lembrar de nossa cumplicidade incondicional, aquela mesma que te fazia me ouvir sem julgar, torcer por mim mesmo sem entender meus objetivos, foi complicado racionalizar a idéia de aceitação, a permissão inegociável de tua partida.
E o que me resta vó? Fala comigo, me diz como viver aqui sem você? Como completar trinta e sete anos e não te ter na minha pequena festinha? Como compreender o silêncio em torno da sua atual inexistência, com cada um vivendo suas vidas, enquanto você vivia a de todos os outros?
Estar lá onde seu corpo permanece, freqüentar a casa cujas lembranças se grudam em todas as paredes, tentar reproduzir suas receitas e não conseguir me faz sentir uma saudade irracional de você... Sempre tenho a estranha sensação, embora tudo tenha mudado e eu esteja muito bem agora, de que aquele dia ainda continua o mesmo, como um relógio enguiçado preso no mesmo momento "aquele". Não esqueça nunca vozinha, que eu jamais deixarei de te amar

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O que vocês querem de mim?

As exigências se somam as expectativas dos outros frente a você, se acumulam, e todos requerem sua dedicação, para isso você tem que estar excessivamente forte, e bem, nem que para isso os subterfúgios e sorrisos amarelos se excedam. No fundo ninguém compreende sua dor, ninguém se dispõe a parar e ouvir tudo que tantas vezes te angustia, numa tentativa solidária de aliviar essa carga insana que carregas nos ombros.
A única recorrência cotidiana se refere aos pedidos pela parte de cada um, mais um favor, mais uma ajuda, mais um conselho, profusões de caprichos. E ninguém se dá conta de que por dentro só restaram restos, cacos de um eu prestes a surtar, porque na verdade nunca importou os teus sentimentos, sua mania de agradar, sua incapacidade de dizer não, desde que nada os atinja, então vista seu melhor sorriso, console-os sempre, e quando todos estiverem bem, se vire com sua angústia menina boba.
E então você pensa em esvaziar vidros de ansiolíticos escondidos na gaveta. Grita no travesseiro que não suporta mais, que está no limite extremo, e que ninguém nota, ninguém te olha com um pouco mais de cuidado, ninguém se afeta, desde você continue sendo útil quando te procurarem.
 Anne Damásio

 Desconheço a autoria da imagem!